COVID-19: administração de excedentes da vacina causam polémica no Reguengo Grande

Três doses da vacina contra a Covid-19 que sobraram do processo de vacinação no Centro Social e Paroquial do Reguengo Grande foram administradas a familiares da presidente da Junta de Freguesia. No total sobraram quatro doses da vacina, apurou a RCL junto da direcção da instituição.

Segundo fonte oficial do Centro Social e Paroquial do Reguengo Grande, que preferiu não gravar entrevista, a selecção das pessoas a quem foram administradas as doses excedentes não foi decidida pela instituição, cabendo-lhe apenas a “responsabilidade de apresentar a lista de utentes e funcionários” a vacinar. A vacinação decorreu no passado dia 22 de Janeiro e no total foram vacinados 24 utentes e 43 profissionais. As doses que sobraram, explicou a mesma fonte, dizem respeito a uma funcionária que estava a faltar ao trabalho e a utentes que estavam internados numa unidade hospitalar à data da vacinação.

Fonte da direcção esclareceu ainda que, de acordo com as informações que obteve, as quatro doses foram administradas a pessoas de grupos prioritários, incluídas na primeira fase do plano de vacinação. Segundo apurou a RCL, uma das pessoas vacinadas trata-se do marido da presidente da Junta de Freguesia.

Questionada pela RCL, Ana Isabel Barros, presidente da Junta de Freguesia do Reguengo Grande, disse-nos que sugeriu que fosse o marido a receber uma das vacinas, “por se tratar de um doente com doença crónica do foro respiratório, com tratamento de ventiloterapia diária”. A autarca garante que a vacinação foi autorizada pelos serviços locais de saúde, mas que se fosse hoje não sugeria o nome do marido.

Para além do marido, foram também vacinados os tios da presidente de junta que possuem cerca de 90 anos. Ana Isabel Barros garante que, nesta situação, o “critério [de vacinação] foi definido pela equipa de enfermagem do Centro de Saúde que estava a trabalhar” no local. A quarta vacina foi administrada a uma enfermeira do Centro de Saúde que ainda não tinha sido vacina contra a Covid-19.

No momento da vacinação estariam no local técnicos da instituição, enfermeiros e dois elementos dos Bombeiros Voluntários da Lourinhã. Ana Isabel Barros disse-nos que foi sugerida a vacinação dos bombeiros presentes no local, mas que não foi autorizado por superiores do Centro de Saúde.

Palavras de Ana Isabel Barros, à RCL. A presidente da Junta de Freguesia do Reguengo Grande, acumula também profissão de administrativa no Centro Social e Paroquial do Reguengo Grande.

De acordo com a Norma relativa à Campanha de Vacinação Contra a Covid-19 – Fase 1, publicada no passado sábado pela Direcção-Geral da Saúde (DGS), estão incluídas na primeira fase “profissionais de saúde directamente envolvidos na prestação de cuidados a doentes, profissionais, residentes e utentes em Estruturas Residenciais para Pessoas Idosas (ERPI), instituições similares e da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI)”. Nesta fase estão ainda incluídas “pessoas com idade igual ou superior a 50 anos”, com várias patologias como insuficiência cardíaca, doença coronária, insuficiência renal, doença pulmonar obstrutiva crónica ou doença respiratória crónica sob suporte ventilatório de longa duração. Pessoas com 80 ou mais anos, bem como “profissionais das forças armadas, forças de segurança, serviços críticos e titulares de órgãos de soberania e altas entidades públicas” também estão contemplados.

A administração das vacinas deve ser organizada de forma a evitar o desperdício de doses. A Norma da DGS indica alguns critérios que devem ser tidos em conta quando haja excedente de vacinas. O documento refere que a vacinação “deve ser assegurada (…) a qualquer pessoa elegível, devendo, na medida do possível, respeitar a ordem de prioridades definida”. No entanto, “a vacinação deve prosseguir, mesmo que não estejam vacinadas todas as pessoas identificadas como mais prioritárias dentro da Fase 1 (por exemplo, a vacinação deve prosseguir para as pessoas com comorbilidades, com menos de 65 anos de idade mesmo que não estejam vacinadas todas as pessoas com 65 ou mais anos).”

De referir que a nível nacional, a Inspecção-Geral das Actividades em Saúde (IGAS) já iniciou uma inspeção para verificar o cumprimento das normas e orientações aplicáveis ao processo de vacinação contra a Covid-19. Esta entidade vai verificar os critérios de selecção das pessoas a vacinar dentro dos grupos prioritários, os procedimentos de gestão das doses excedentes e as medidas preventivas do desperdício.

Nesta fase, a inspecção vai abranger as cinco administrações regionais de saúde, os hospitais, os centros hospitalares e as unidades locais de saúde do Serviço Nacional de Saúde, bem como algumas entidades que integram os serviços centrais do Ministério da Saúde. A IGAS irá reportar semanalmente às entidades gestoras do processo de vacinação as falhas e fragilidades identificadas, com recomendações para corrigir os erros identificados.